Um legado para a eternidade

Radamés Gnattali está presente em muitas canções e temas que cultuamos até hoje na música brasileira

Lia Machado Alvim 29/01/11 18:10 - Atualizado em 29/01/11 18:10

“Inspiração é trabalho”  (Radamés Gnattali)

Pianista, compositor, maestro, arranjador, professor – Radamés Gnattali exerceu todas estas funções em seus mais de 60 anos de carreira. E como exerceu. Muito e com qualidade. O músico transitou na área erudita e popular, sendo reverenciado por artistas de sua geração e das seguintes, sem distinção.

Sua discografia popular começa no final dos anos 40 e vai até meados dos anos 50 com lançamentos em 78 rpm. São valsas, choros, tangos, boleros, maxixes, canções regionais. Em 1954 lançou um vinil de 10 polegadas, sêlo Sinter, dedicado à obra de Ernesto Nazareth com novos arranjos e acompanhamento de orquestra. A fase dos long plays tem início em 1955 na carreira de Radamés e o álbum Samba em três andamentos já mostra bem sua versatilidade, apresentando no mesmo trabalho gravações com conjunto, orquestra e solos de piano.

Neste mesmo ano, Radamés Gnattali lançou, mais uma vez pela gravadora Sinter, o Lp Ecos do Brasil – Radamés Gnattali ao piano no qual inaugura o som da batucada com o piano – espaço para os percussionistas, que também ganharam lugar em suas orquestras.

A discografia de Radamés Gnattali acompanha a evolução musical do inquieto maestro e músico que sempre foi. Álbuns gravados durantes turnês européias, acompanhado por seu regional no início dos anos 60; o LP Retratos que dividiu com Jacob do Bandolim; sua parceria com o violonista Laurindo de Almeida em Suíte popular brasileira – violão e piano, de 1966, estão entre os destaques de suas primeiras décadas de carreira discográfica inidividual.

Um berço erudito
O nome de Radamés foi inspirado na ópera de Verdi – Aída. Como ele, dois de seus irmãos também tiveram seus nomes tirados de personagens da mesma peça: Ernani e a própria Aída, a irmã pianista de Radamés com quem ele se apresentou muitas vezes. O pai de Radamés, Alessandro Gnattali – imigrante italiano, foi compositor, músico (fagote, piano e contrabaixo) e professor. Sua mãe, a gaúcha Adélia Fossati Gnattali, também era pianista e lhe deu as primeiras aulas ao piano aos 6 anos de idade. O músico tem ainda outros dois irmãos mais novos: Alexandre e Terezinha.

O rádio depois de Radamés Gnattali

No Rádio, Radamés levou à sério a máxima "Pau pra toda obra". Ele é responsável pelos arranjos criados nas duas emissoras cariocas que movimentaram o meio muiscal antes do surgimento da televisão: a Mayrink Veiga e a Nacional, onde trabalhou por 30 anos. Radamés fazia os arranjos para todos que circulavam nos corredores das emissoras e muitos deles ficaram eternizados nas vozes de Dick Farney, Dorival Caymmi, Elizeth Cardoso, Orlando Silva, Francisco Alves, Silvio Caldas, Aracy de Almeida e tantos, tantos outros. Um milhão de melodias era o nome de um programa de Rádio de Radamés – que estreou em 43 e se tornou sucesso de audiência. Seus temas ganhavam assim mais espaço como também os repertórios de grandes músicos como Pixinguinha,  Chiquinha Gonzaga e Ernesto Nazareth.

Radamés na telinha
O incansável maestro migrou para a TV como a mesma impetuosidade com que abraçou a música popular em detrimento da erudita anos antes. Foi neste momento que, financeiramente, seu trabalho como compositor e arranjador foi reconhecido. Na TV Excelsior começou em 1963. Quatro anos depois foi para a Globo onde ficou até pouco antes de sua morte.

Radamés tocando cavaquinho e violão
O conhecimento de Radamés de outros instrumentos, como o violão e o cavaquinho, aconteceu ainda na sua juventude. Por tocar um instrumentos nada prático de transporte, o garoto Radamés optou por estes dois outros para poder participar de blocos carnavalescos e grupos de serestas.
Ao piano Radamés se apresentou em cinemas de Porto Alegre fazendo o acompanhamento de filmes mudos nos anos 20, atividade que o aproximou de Ernesto Nazareth, que Radamés conheceu na sua primeira viagem ao Rio de Janeiro – Nazareth já era famoso tocando seu piano na sala e na ante-sala no Cine Odeon.

Rio Grande do Sul – Rio de Janeiro
O que levou mesmo Radamés a se mudar de Porto Alegre para o Rio de Janeiro foi a oportunidade que não se concretizou: dar aulas na UFRJ como professor catedrático. O concurso para o qual foi chamado não aconteceu, mesmo com a promessa de Getulio Vargas, então presidente do Brasil. Mas Radamés se tornou professor de muita gente. Direta e indiretamente. Ministrou aulas particulares para melhorar sua renda e ensinou informalmente muitos músicos tanto nas orquestra que dirigiu, como nas parcerias que fez. Jacob do Bandolim foi um de seus grandes amigos que mudou a maneira de encarar os ensaios e estudos da música depois de gravar com Radamés e ainda aplicando com os músicos de seu regional.

Um erudito popular
O que Radamés aprendeu desde suas primeiras lições de piano – a música clássica – ele utilizou com maestria para aprimorar a música popular. Mais excepcional ainda foi o caminho inverso. O ritmo e os compassos da música popular deram frescor e movimento à música erudita criada pelo maestro ao longo de sua carreira que resultou em obras importantíssimas como: “Brasiliana nº 1” (obra gravada pela Orquestra BBC de Londres nos anos 40); e as demais brasilianas “Concerto Carioca nº1” – concerto que chegou a ser criticado na época de seu lançamento pelos mais puristas que não aceitavam as influências populares de Radamés; seus concertos para harpa e orquestra, violinos e orquestra. (ver todas as obras no site do músico)

Radamés do cinema mudo a “Rio 40 graus”
Do piano que tocava para acompanhar as exibições de filmes ainda sem som, Radamés passou a criar as trilhas para o cinema nacional. Uma delas foi para o filme Ganga Bruta, de Humberto Mauro, de 1933; outra importante trilha foi criada para Rio 40 graus, de Nelson Pereira, de 55.  Radamés criou a música que serviu de trilha sonora para cerca de 50 filmes, de comédias a musicais.

Radamés e a Camerata Carioca
Nos anos 70 Radamés Gnattali esteve presente na retomada do choro por jovens músicos. Algo muito parecido com o que aconteceu há poucos anos com o samba no bairro da Lapa.
Neste período o maestro se relacionava muito bem com jovens instrumentistas que se tornaram seus alunos e parceiros como Mauricio Carrilho, Joel Nascimento, Henrique Cazes, Raphael Rabello e Luciana Rabello entre outros. Estes músicos criaram sob direção do pianista a Camerata Carioca – Joel Nascimento no bandolim, João Pedro Borges, Mauricio Carrilho e Raphael Rabello nos  violões,  Luis Otávio Braga, violão de 7 cordas, Henrique Cazes e Luciana Rabello que revezaram no cavaquinho em gravações e Celsinho Silva na percussão. A Camerata gravou 4 discos entre os anos de 79 e 83.
 

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