Domenico e Pedro Sá: pura celebração

'Vamos estar fazendo' é a nova aventura da dupla. Jam ou ensaio aberto, a ideia é deixar-se “levar” pelo som. Confira a entrevista com Domenico Lancellotti.

Julio de Paula 11/12/10 08:28 - Atualizado em 11/12/10 08:28

Momento Polaroid: três registros da amizade e parceria artística de Domenico (d) e Pedro Sá. (Divulgação)

“Quase religião” ou “puro sentimento” são definições abstratas e decisivas para entender a música a partir de Domenico Lancellotti. Baterista que divide-se entre outros instrumentos, a produção e a composição, ele integra um certo conglomerado de músicos cariocas que se lançam o desafio de intercambiar e experimentar. Nesse meio, ninguém é o dono da bola (ou a bola da vez é temporária). O projeto +2, por exemplo, aboliu a ideia de band-leader. Um de seus pares de longa data, Pedro Sá, é guitarrista com larga experiência em bandas, incluindo as últimas formações que acompanharam Caetano. Juntos, Domenico e Sá já vêm atuando desde "Mulheres que dizem sim", banda emblemática dos anos 1990.

Vamos estar fazendo é a nova aventura da dupla, que explora recursos da guitarra e da bateria na construção de texturas musicais pulsantes – uma espécie de escultura sonora. Jam ou ensaio aberto, a intenção é deixar-se “levar” pelo som - músicos e ouvintes. Ao mesmo tempo, o projeto trabalha a ideia de deslocamento, trazendo para os palcos o que estava restrito ao âmbito dos músicos, em ensaios e passagens de som. “Estamos mais interessados no processo do que no resultado final”, esclarece Domenico.
 


A seguir, Domenico fala sobre o “movimento” carioca, os +2, além do novo projeto numa mini-entrevista via e-mail:

Julio - Vocês integram um núcleo de produção (ou seria criação?) que considero dos mais férteis no Brasil de hoje. Poderia dizer que pela busca do novo e até mesmo pela provocação. Que turma ou que movimento é esse?
Domenico -
Salve, Julio, agradeço o interesse e as palavras. Não sei se existe um movimento, temos de fato a sorte de estarmos crescendo juntos, incluindo nisso um grupo grande de músicos que convivem na experiência ímpar que é a Orquestra Imperial, e isso é muito inspirador. Desde que começamos o "+2", e imaginamos o formato de alteração do band-leader a cada trabalho, logo vimos que estávamos no centro de uma confluência, sobretudo estética, que ajudou a agregar muitas figuras. A própria formação da O.I. foi consequência disso, mas a cada dia aparece mais gente, também de outras cidades. Além das pessoas de nossa geração, ainda temos a alegria de trabalhar com músicos de duas ou três gerações anteriores. Isso, acredito eu, é um privilégio brasileiro, em nenhum outro lugar que conheci há algo parecido, muito pelo contrário, as gerações disputam. E em nenhum lugar existe melhor escola de música do que essa convivência. Falo isso porque Wilson das Neves me ensinou que música é puro sentimento. E não existe nada mais moderno do que você saber se expressar com verdade.

E o projeto +2? Tem lançamentos futuros? Estamos esperando um novo álbum...
Pois é, em cada álbum o "+2" passou por uma transformação revolucionária, mudando de nome, de estilo, de voz, mas para tudo continuar no mesmo. Os três discos tem em comum uma linha de raciocínio: ter a canção tradicional em primeiro plano, mas tratada de forma não convencional, a maneira de captar os sons, a preservação da emoção mesmo contando com erros ou coisas que num processo moderno seria "corrigido" pela máquina, querer cuidar de todo processo de realização do disco, desde compor, arranjar, tocar, até a capa, e toda a parte técnica. No início nós combinamos três disco, mas acabamos fazendo cinco durante esses 10 anos (tem o de remix do Moreno+2 que é pouco conhecido). Queríamos ter como último álbum algo que pudesse ser assinado como "+2", sem nenhum nome na frente. Aproveitamos o convite do Grupo Corpo para realizar este e assim encerrar a banda e continuar seguindo nosso histórico mutante. Eu, entretanto, estou com meu disco pronto, com lançamento previsto para logo após o carnaval. Estou muito contente com esse trabalho que se chama Cine Privê e que demandou meus últimos dois anos e alguns meses. Convidei o Mario Caldato Jr. para mixar e o som está um espetáculo. É um disco que segue a linha "+2"; conta com Kassin, Moreno, Pedro Sá, Alberto Continentino, Stephane San Juan, mas eu assino sozinho.

Você e o Sá têm longa convivência. Fale um pouco do VEF e essa ideia do som que deixa levar. É música que vocês vêm experimentando e que resolveram “abrir”?
O Vamos estar fazendo é pura celebração de nossa amizade e convivência. O Pedro foi quem me apresentou ao Moreno e ao Kassin, esteve comigo também em minha primeira banda, Mulheres que Dizem Sim. Nós temos juntos uma afinidade que já transpassou duas décadas. Esse nosso projeto se deu porque pensamos em mostrar algo que sempre fizemos nos ensaios, nos bastidores, nos estúdios, passagens de som, mas nunca para o público. Começamos a ver esses momentos sublimes de improviso, de “levação” de som, regozijo, como algo rico e interessante também para as pessoas. Valorizo muito o improviso. Às vezes ficamos muito presos à forma e ao acabamento. Tudo que existe na arte começou como improviso, até mesmo os quadros de Velásquez ou Rembrandt. O que estamos fazendo é abrir o processo criativo que é comum a muitas profissões distintas. Estamos mais interessados no processo do que no resultado final. Inclusive pode vir a não dar certo!

O objetivo é explorar sonoridades a partir da improvisação livre? Ou vocês têm temas definidos?
É livre, não preparamos nada e nem passamos o som, temos as limitações da bateria e da guitarra.

Work in progress? Obra aberta? Vai resultar em algo? Isto seria um ensaio pra algum projeto definido? Ou estão deixando rolar?
É o que é, e é quase religião.



O ENCONTRO
Domenico Lancellotti e Pedro Sá em Vamos estar fazendo
Domingo, 12/12/10, às 21h, no Tapas Club, em São Paulo. Ingressos a 10 reais.

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